52 e a decrescer. A contagem diminui minuto a minuto e no entanto parecem minutos do tamanho de horas. Uma ilusão fruto da impaciência, do aborrecimento.
49 e as conversas passam ao lado. Os meus colegas de trabalho, comentam as novelas do dia anterior e os vestidos dos Globos de Ouro, não têm nada a ver comigo e não têm a menor ideia do que é que eu gosto, apenas me acham estranha, elitista, armada em intelectual. Não percebem porque é que eu leio de tudo, porque é que gosto de cinema, porque é que eu vou ao teatro, porque é que eu sei um pouco de tudo e quando não sei, chego no dia seguinte com a explicação. Acham estranhos os livros que leio, pedem-nos emprestados e devolvem-nos, dizendo que não passaram da décima página e eu, eu que os li num fôlego, sinto-me uma alienígena.
39 e nada de interessante se passou, nada de interessante foi dito, nada de interessante foi feito. Quando explico que preciso de outro emprego, todos acham que devo dar graças a Deus por já ter um e eu concordo, concordo com aquela mágoa dentro do peito que me leva a repensar os meus passos, a revalidar os meus gostos, as minhas prioridades.
25 e alguns colegas começam sair. Que saiam, que nada me dizem. Digo “Até amanhã!”, como se dissesse: “Não se esqueçam do Pão!”, ou outra coisa qualquer. Amanhã voltarão com as suas vidas iguais, padronizadas, horizontes limitados e eu penso, mais uma vez, em como os meus sonhos, os meus horizontes alargados, são uma prisão, um martírio.
18 e a ansiedade de sair dali, de poder ler, escrever, exercitar o raciocínio, dar trabalho às células cinzentas, acordá-las da letargia que o meu emprego representa, torna-se insuportável.
5 minutos para sair e começo a preparar as coisas. Bem podia começar a prepará-las assim que entro, porque as horas que passo naquele escritório, equivalem a uma morte prematura… pelo menos a uma morte cerebral.