Pois é! Depois de umas férias que correram como água (talvez por causa do tempo que meteu muita água neste Verão), estou de volta ao trabalho e o tempo acompanha o meu estado melancólico.
Mas jogos de palavras à parte, a verdade é que depois de um acordar muito agradável, lento e gradual, culminado num libertar de endorfinas regenerador de uma noite que não dei por passar, com a banda sonora da chuva a bater nos estores do quarto, eu gastei os 50 cêntimos mais bem gastos em toda a minha vida.
Devido ao acordar gradual, o tempo hoje foi escasso e tive de tomar o pequeno almoço no carro. Mas antes, quando fui levantar dinheiro e comprar uma revista para entreter os olhos, a senhora perguntou-me se não queria levar dois livrinhos pequeninos sobre música; um sobre fado e outro sobre Jazz. Como olhei para eles com renitência, ela disse-me: "São apenas 50 cêntimos e cada um trás uma colectânea de músicas num CD!". Lá me convenceu. Comprei os dois, mais a revista e fui para o carro.
Como ainda faltavam uns minutos (eu vou sempre cedo demais para o trabalho, mesmo quando digo que já estou atrasada), coloquei o cd de Jazz a tocar e li um livro sobre a Vieira da Silva, que andava de um lado para o outro no meu carro, depois de o ter comprado numa feira do livro qualquer, durante o Verão.
Foram os melhores 20 minutos, antes do trabalho, de sempre. A música decorria com ligeireza, elegante e cheia de swing, com diálogos de instrumentos inteligentes e contidos, perfeitos para animar uma serena melancolia, sem exaltar demasiado e relaxando quanto baste. Foi quase um momento Zen de consciencialização do fim de semana que vem aí.
Depois li o "Testamento" de Vieira da Silva e decidi roubar algumas cores só para mim; talvez um Terra Sombra, e um Terra Siena!
Para vocês que têm paciência para me ler:
Testamento
Um azul cerúleo para voar alto.
Um azul cobalto para a felicidade.
Um azul ultramarino para estimular o espírito.
Um vermelhão para o sangue circular alegremente.
Um verde musgo para apaziguar os nervos.
Um amarelo ouro: riqueza.
Um violeta cobalto para o sonho.
Um garança para deixar ouvir o violoncelo.
Um amarelo barife: ficção científica e brilho; resplendor.
Um ocre amarelo para aceitar a terra.
Um verde veronese para a memória da primavera.
Um anil para poder afinar o espírito com a tempestade.
Um laranja para exercitar a visão de um limoeiro ao longe.
Um amarelo limão para o encanto.
Um branco puro: pureza.
Terra de siena natural: a transmutação do ouro.
Um preto sumptuoso para ver Ticiano.
Um terra de sombra natural para aceitar melhor a melancolia negra.
Um terra de siena queimada para o sentimento de duração.
Maria Helena Vieira da Silva
2 Ideia(s):
Paciência e prazer em ler-te.
Jorge Soares
Obrigada.
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