Estou farta de ouvir toda a gente dizê-lo constantemente. É como uma sinfonia
cacofónica, estridente, pós-moderna, de sons que saltam das gargantas dos interlocutores, deslizam pelos seus lábios e voam na direcção das minhas desmesuradas orelhas, percorrem toda a elíptica rampa, entram no pequeno túnel e batem no tímpano, ricocheteando para o meu cérebro: “Têm que te amar, por aquilo que és!”
Coitados!
Tenho a certeza que as intenções são as melhores, que as pessoas não pretendem o mal de ninguém quando o dizem, mas a verdade é que esta velha frase, não apazigua quem a ouve, muito pelo contrário. Se já leram até aqui, acompanhem o meu raciocínio por um pouco.
As pessoas amam e gostam de quem é agradável à vista e fácil na convivência. Preferem pessoas bonitas e amáveis, de grande empatia, que as compreendam, que concordem, que se deixem levar. Por isso, quando dizem: “As pessoas têm que gostar daquilo que és!”, não estão, na realidade, a colocar a bola no outro campo, apenas estão a reforçar a ideia de que temos que ser bonitos, simpáticos, empáticos. Estão a colocar, mais uma vez, a bola nos nossos pés e esperam que não falhemos o próximo passe.
Sim, dizem que têm que gostar de nós pelo que somos, mas pressupõem que as pessoas vão gostar do que somos e de que somos o que as pessoas gostam. Mas a maioria das vezes não gostam e não somos o que os outros pretendem que sejamos.
Eu daria tudo para que alguém incluísse nessa velha, mas não cansada frase de motivação despropositada, apenas uma, reparem que digo “apenas” uma palavra, para que o meu cérebro percebesse o som transportado pelo ar como: “As pessoas têm que te amar, apesar daquilo que és!”
Aí sim! Aí o passe teria sido feito na perfeição e a bola estaria agora no campo do adversário, à espera do ângulo perfeito, do pontapé certo, da força na medida exacta, para encontrar as redes da baliza e fazer golo. Aí, todo o esforço ficaria do outro lado e estaria apenas dependente da vontade, da capacidade quase sobre-humana, de alguém amar outra pessoa, apesar de tudo.
Confuso?!
Bem, é assim que a minha mente trabalha, agora depende de vocês gostarem ou não.